sábado, 26 de novembro de 2011

Cerco


Então, de repente, o motor do Palio 2007 preto que dirigia morre. Gelei, e tudo o que consegui pensar e dizer naquele momento se resumia em apenas uma palavra:

- Fudeu.

Logo a frente, naquela entrada da favela onde tentava entrar discretamente, começo a ver figuras negras moverem-se apressadamente para ambos os lados da rua, buscando abrigo. Não são suas silhuetas que me assustam, mas a silhueta do que teem na mão.

Giro apressado o chave na ignição. Ronca, liga, mas morre em seguida, enquanto as sombras começam a avançar mais rapidamente em minha direção.

- Porra! Funciona, cacete!

- Apaga o farol, filho da puta!

Obedeci. Em instantes, o carro está cercado. Mais fuzis do que consigo contar estavam, neste momento, apontados para mim. "Deus, por favor...".

Alguns traficantes abaixam e olham pra mim e pra dentro do carro, sem falar nada. Então o que possuia um M16 e usava um boné da Adidas, falou, sem mover o fuzil da minha direção.

- Qual foi, porra?! Tá maluco?! Como é que tu chega nessa porra com o farol alto? Quer levar chumbo, caralho?!

- Foi mal, irmão, foi mal mesmo... O carro só morreu e esqueci de apagar o farol, foi mal mesmo.

Luto pra manter o autocontrole. Ao ouvir isso, percebendo (uma falsa) inocência na minha voz, o vagabundo abaixou o M16, ainda com cara de puto. Os outros abaixam também. Achei o "chefe". Ei, é "ele". Sim.
Outro marginal (menor, com certeza), do meu lado direito, faz a pergunta crítica:

- Tu mora onde, mané?

Penso rápido.

- Ah, que isso?! Num tão me reconhecendo não? Sou 'cria', porra. Cresci la na Cova do Tatu (nome fictício), pô, mas agora tô com a minha tia em São Paulo. - Viro na direção do gerente. Não tenho que dá satisfação pra "bucha", mas pra ele - Só vim ver minha mãe, irmão.

Ele pára por um instante, olha pra mim e para o carro de novo.

- Já é, já é. Vai lá, se adianta. Mas pelo amor de Deus, num faz isso de novo não, caralho!

- Valeu, valeu irmão, foi mal mesmo...

Com isso, os vagabundo se afastam do carro. Já ligado, avancei. Acenei uma última vez para o gerente, dei uma piscadinha no farol, e segui favela a dentro.

Minhas mãos suavam e tremiam. Ainda assim, peguei o celular. Quando ele atendeu, disse, no viva voz, quase não movendo os lábios e ainda muito discretamente:

- Achei o Playmobil. Tá aqui. Inicia a operação, e pede apoio aéreo da Civil. Vou esperar no Tatu o "três-meia-zero". Trás meu fuzil.

Vim encontrar um alvo, e quase vou pro micro-ondas. Mas não estava acabado. Ia ter que ir mesmo até a Cova do Tatu (sorte que estudei bem a área), pois os vagabundos me "escoltariam" via rádio, pra saber se dizia a verdade. 
Conheço como esses filhos da puta agem, achei meu alvo e não pretendo morrer hoje.
Porra... Inteligência não é função para os fracos não.

Persival.

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